30.5.06

Mania de Você

Ele zapeando os canais pelo controle remoto, como de costume. Ela, concentrada no trabalho, com documentos espalhados pela cama toda.

Ela: ...
Ele: ...
Ela: Ai, César. Eu odeio essa sua mania.
Ele: Foi você quem me deu aquele remédio pra eu tomar.
Ela: Que remédio, homem?
Ele: Aquele que "alivia" os gases.
Ela: Eu não tô falando da mania porca.
Ele: Ah, não. Então tá falando de qual?
Ela: Tava falando dessa sua mania de ficar mudando de canal 546 vezes por noite.
Ele (piadista): Você contou?
Ela: Não me enche.
Ele: Ah é, e quem tá enchendo aqui?
Ela: Não dá pra parar num canal. Tem que ficar apertando essa merda desse controle.
Ele: Não tem nada na TV.
Ela: Ah, tem sim.
Ele: ...
Ela: Não tem futebol hoje?
Ele: Não, hoje é segunda.
Ela: E a novela?
Ele: Eu já sei o que vai acontecer. Uma cliente me contou.
Ela: Ué, e daí? Vê mesmo assim. Eu sempre leio antes o que vai acontecer e mesmo assim vejo a novela.
Ele: Eu prefiro zapear os canais.
Ela: César, tá me atrapalhando.
Ele: Eu hein, Luiza. Cama é descanso, não é labuta. Quer trabalhar, vai lá pra sua empresa, vai.
Ela: Eu não acredito nisso.
Ele: ...
Ela: César?!...
Ele (zapeando canais): ...
Ela: E o telejornal? Coloca no telejornal.
Ele: Oh, Luiza. Quer parar com isso?
Ela: Ai, César. Será que eu vou ter que esconder esse controle remoto?
Ele (ri): Ah, tá bom. Vai me tratar como uma criança de sete anos, agora? Vê se pode.
Ela pega o controle e joga pela janela.
Ele (debruça na janela, depois vira pra ela): Caralho, viu!
Ela: Você pediu.
Ele (senta na cama): ...
Ela: ...
Ele: E agora?... agora, o que é que eu vou fazer?

21.5.06

Os Três Pontinhos

Posição rara: dois sentados na cama, lendo. Ele olha pra ela e volta a ler. Ela faz o mesmo, em seguida.

Ela: ...
Ele: ...
Ela: César.
Ele: Oi...
Ela: Você já reparou numa coisa?
Ele: No quê, meu amor?
Ele: Quando a gente fica sem assunto, ou quando há uma pausa entre as nossas conversas, sempre aparece aqueles "três pontinhos".
Ele: Como assim?
Ela: ...
Ele: ...
Ela: Viu só.
Ele: Ah, sei. Os "três pontinhos".
Ela: Então... você não acha estranho?
Ele: Não, já me acostumei.
Ela: Pois eu não.
Ele: Meu amor, esse é só um jeito do cara escrever a nossa história.
Ela: Que cara? Tem um cara por trás dos "três pontinhos"?
Ele: Tem. O Giu.
Ela: É ele quem escreve tudo isso?
Ele: É. Ele escreve, aí o pessoal que entra no blog lê, comenta, e a gente fica conhecido.
Ela: Sério? Quer dizer que eu tô ficando famosa?
Ele: Não força a barra, né, Luiza.
Ela: ...
Ele: Aí, viu... já tá se acostumando com os "três pontinhos".
Ela: É... pensando bem... até que não é tão esquisito assim.
Ele: Por falar em esquisito, hoje é aniversário do Giu.
Ela: Do cara que escreve?
Ele: É.
Ela: Ih, seria melhor se a gente comprasse um presente pra ele.
Ele: Ah, eu não vou comprar, não. Nem conheço esse cara direito.
Ela: Mas ele te conhece muito bem.
Ele: Então, ele que me dê presente no meu aniversário.
Ela: Puta que pariu, né, César. O cara tá contando a nossa história.
Ele: Eu nunca pedi para que ele contasse. Tá fazendo isso porque quer.
Ela: César, o cara nos deu os "três pontinhos", né, amor... olha a falta de reciprocidade.
Ele: Reciprocioquê?
Ela: Não muda de assunto. Pelo menos dá um telefonema a ele.
Ele (bufando): Ai, tá bom, tá bom.
Ela: Muito bem.
Ele: (pegando o notebook): Vou mandar um scrap pelo orkut.
Ela: De novo essa bosta desse orkut.
Ele: Orkut não cobra tarifa pro Rio de Janeiro.
Ela: É. Então manda, vai.
Ele: ...
Ela: ...
Ele: Quer saber? Esses "três pontinhos" já tão me enchendo o saco.
Ela: Eu ia falar isso agora.

18.5.06

Defeitos

Dois sentados na cama, em frente à televisão.

Ela (zapeando canais): Nossa... não tem nada na TV!
Ele: Noite de domingo... a essa hora... A gente devia estar dormindo também, né.
Ela: Que horas são?
Ele: Quase 1 da manhã.
Ela: Então já é segunda.
Ele: Ahn?
Ela: Já é segunda-feira, já passou da meia-noite.
Ele: E daí?
Ela: E daí que você disse "noite de domingo", quando na verdade, nós estamos vendo TV numa madrugada de segunda-feira.
Ele: Luiza, você sabe que essa é uma qualidade sua que todo mundo odeia, não sabe?
Ela: Que qualidade?
Ele: Qualidade, não. Grande defeito.
Ela: Que defeito? Eu tenho defeitos?
Ele (irônico): Poooooorra... agora eu vou ter que ficar olhando no relógio pra ver se já passou da meia-noite, pois se eu quiser um dia, na minha vida, manifestar uma idéia de tempo no meu relato, no que consta dias, horas e minutos, não poderei jamais me dar ao luxo de errar o dia da semana. Se é uma noite de quarta ou uma madrugada de quinta? Ó Lorde cósmico, me diga!
Ela: Madrugada de quinta, é essa aqui... ficar discutindo com um "zero à esquerda" que nem você... madrugada de quinta categoria.
Ele: Taí, outro defeito seu. Esses trocadilhos ridículos.
Ela: ...
Ele: Sem contar essas expressões da Era Clássica. "Zero à esquerda", "Tá tudo jóia".
Ela: Eu falo "tá tudo jóia"?
Ele: Fala.
Ela: César, seu...
Ele (interrompe): E sem contar aquela risadinha sem graça que você faz quando encontra alguém que não gosta, na rua.
Ela: Que risada?
Ele: Aquele sorrisinho sem graça que vem depois do "tudo bem?".
Ela: Como é?
Ele: Você fala "Oi. Nossa... Tudo bem?" e depois estica os lábios, meio Coringa. Sabe o Coringa do Batman?... Estica os lábios e faz um barulho que, pra mim, mais parece um arroto pra dentro.
Ela: Quer saber de uma coisa, César?
Ele: O quê?
Ela (se vira de costas pra ele): Vá tomar no seu cú.
Ele: Outro defeito seu. Não consegue sair de uma discussão, na qual estar perdendo, sem mandar a outra pessoa praquele lugar, ou tomar naquele lugar, ou colocar o pinto...
Ela (vira pra ele de novo): César!!
Ele (interrompe): Não, tudo bem. Desculpe, se eu te "enchi as paçocas", tá, meu bem?
Ela: Ah, vá a merda.
Ele: Não disse.

15.5.06

Momentum 2

Eles chegam de um jantar na casa de uns amigos. Ele tira o sapato e deita na cama. Ela senta do lado dele.

Ele: Pô, festão, hein... nossa...
Ela: Nem me fale. Quanta comida.
Ele: E quanta bebida!
Ela: Nem me fale.
Ele (fica olhando pra ela): ...
Ela: ...
Ele: Que foi?
Ela: Nada. Tô meio estranha.
Ele: Estranha?!
Ela: É. Tô passando meio mal. Sei lá. Sabe quando você se sente meio estufado? Um desconforto estomacal? A barriga cheia, fica meio rosnando... sabe? Tô meio assim.
Ele: Ai, eu também, amor, tô com uma vontade de peidar que você não tem idéia.

7.5.06

Momentum


Quinta-feira. Vinte e duas horas e trinta e seis minutos. Leitura pré-sono. Dois sentados na cama em frente a seus respectivos livros.

Ele larga o livro e olha pra ela. Ela concentrada.
Ele: ...
Ela: ...
Ele (esticando os braços e espreguiçando): ...
Ela: ...
Ele: Então...
Ela (sem desviar o olhar): Hum...
Ele: Tá animada pra Copa?
Ela: César, a gente não precisa ficar conversando o tempo todo.
Ele: Ah, tá.

Quinta-feira. Vinte e duas horas e trinta e sete minutos. Ele apaga a luz e vira para dormir. Ela acende o abajur, porque ainda não acabou de ler o capítulo 16 de Harry Potter e a Ordem da Fênix®.

3.5.06

Anticontraceptivos


E no meio das preliminares...

Ele: Peraí.
Ela: Que foi?
Ele: Tem um negócio aí.
Ela: Onde?
Ele: Aqui... O que é isso, Luiza?
Ela: Isso o quê, César?
Ele: Esse adesivo grudado na sua barriga, aí.
Ela: Ah, isso?... É meu novo método anticoncepcional.
Ele: Método anticoncepcional?
Ela: É.
Ele: Com esparadrapo?
Ela: Não, é um tipo de anticoncepcional, ué.
Ele: ...
Ela: ...
Ele: Por acaso você tatuou um pinto na sua barriga ou coisa parecida?
Ela: Ai, meu Deus.
Ele: Não, porque uma prima minha apareceu uma vez com uma tatuagem na virilha, e tapou com um esparadrapo pra minha tia não ver...
Ela: Por quê?
Ele: Porque era um desenho do snoopy enfiando o nariz na perereca.
Ela: César, não é uma tatuagem indecente, é só... vem cá... como é que tu sabe que o snoopy enfia o nariz na perereca dela?
Ele: Ué, praia, Luiza. Praia. Eu fui na praia com ela, ela tava de biquini. Sabe, esses biquinis curtinhos?
Ela: Ah... sei.
Ele: Nâo é tatuagem, então? Mesmo?
Ela: Ai César, você ainda se julga inteligente. O atual ultra-moderno. Isso é um adesivo que não
me faz ficar grávida. Francamente, pra um engenheiro, você tá por fora, hein.
Ele: Quem tá por fora é você. Eu não sou engenheiro.
Ela: Ah não... e o que você faz?
Ele: Porra, Luiza. A gente tá casado há quase cinco anos e você não sabe qual a minha ocupação?
Ela: Eu já soube um dia. Tem haver com marketing, não tem?
Ele: Misericórdia... bom, isso não vem ao caso... eu tava falando dessa figurinha colada no teu abdomêm.
Ela: Amorzinho, isso aqui é um adesivo como aqueles que usam para parar de fumar. E eu tô
usando para não correr o risco de engravidar. É como se o meu útero parasse de ovular.
Ele: Meu amor, eu acho que você anda fumando pelo lado errado.
Ela: Nossa, mas as piadinhas hoje estão excelentes, hein!
Ele: Desculpe, é que eu não consigo imaginar que uma simples fita adesiva possa
conseguir atingir tal efeito.
Ela: O adesivo impede que eu ovule, César.
Ele: Ah, essa é muito boa.
Ela: O quê?
Ele: Você quer ter outro filho? É só me dizer.
Ela: Não, eu não quero.
Ele: Então por que você quer eu acredite nisso?
Ela: Porque é verdade.
Ele: Ah, tá legal. Então eu vou colocar um band-aid no meu pau, quem sabe eu pare de ejacular...
Ela (tira o adesivo e entrega pra ele): Ah, que saco. Toma.
Ele: O que você vai fazer?
Ela (vestindo o sutiã): Vou usar outro anticoncepcional para não ter filho com você.
Ele: Qual?
Ela: Vou dar pro vizinho.
Ele: Vai, é?
Ela: Vou.
Ele: Então, toma... coloca o adesivo.